“Meu marido não ajuda em casa.” Você já ouviu – ou já falou – essa frase?
Em geral ela vem acompanhada de outras, que provavelmente você conhece também: “Tarefa de casa é coisa de mulher”; “Meu marido não lava louça nem passa roupa porque isso iria ferir sua masculinidade”; “Você tem sorte, fulano te ajuda tanto!”; A mulher gosta de reclamar, não dá valor ao que o homem faz”; “Quem sabe como cuidar da casa e dos filhos é a mulher, homem não nasceu pra isso”; “A culpa é da mãe dele, que o criou mal”.
Esse padrão, apoiado na dicotomia homem provedor/ mulher cuidadora, definitivamente não faz mais sentido na vida contemporânea, e o motivo é simples: ele não funciona mais. No entanto, na maior parte dos lares com indivíduos do sexo masculino e feminino, esse arquétipo se perpetua – inclusive entre as crianças e adolescentes.
De acordo com o censo mais recente do IBGE, em média a mulher que trabalha fora dedica 18,5 horas semanais aos cuidados com a casa, contra 10,4 horas do homem na mesma situação – ou seja, quase o dobro do tempo.
Efeitos da pandemia
De acordo com um estudo do Boston Consulting Group com casais que trabalham fora e têm filhos no Reino Unido, Estados Unidos, França, Alemanha e Itália, durante a pandemia (com o fechamento de escolas, redução da rede de apoio e aumento do home office), as mulheres passaram a dedicar às tarefas domésticas 15 horas a mais por semana em relação aos homens.
“Parece que, se as pessoas abrirem mão do padrão historicamente estabelecido, vão ficar confusas, perdidas sobre o seu papel na família e na sociedade. No entanto, essa virada é necessária. E sabemos que, ao longo da história, vale o ditado ‘os incomodados que se mudem’ – nesse caso, ‘os incomodados que quebrem paradigmas’. Ou seja, a transformação vai partir da mulher, que se sente sobrecarregada com jornadas duplas e até triplas, mas com participação efetiva do homem”, analisa Marcia Belmiro.
Valorização ou barganha?
Na internet, há inúmeros vídeos e textos em blogs ensinando como “fazer o marido ajudar em casa”. Na maioria desses conteúdos, mulheres dão dicas do tipo: “Mesmo que ele não lave a louça direito elogie, para que ele se sinta motivado. Vai ser pior para você se ele não fizer nem isso.” Ainda na linha do reforço positivo para aumentar o engajamento, há sugestões para a mulher “caprichar no sexo como forma de recompensa”.
“Não se deve recompensar alguém por cumprir com sua responsabilidade na divisão de tarefas da casa que é de todos. Seguindo o mesmo raciocínio, não é preciso lembrar ao homem que faça essas tarefas. Por acaso no trabalho dele é preciso que alguém o lembre periodicamente de que deve entregar o relatório mensal? Por outro lado, todos que colaboram para a limpeza, arrumação e harmonia da casa podem e devem ser valorizados por seu empenho”, compara Marcia.
Marcia Belmiro orienta as famílias a como podem dar o pontapé inicial para essa virada:
– Ter conversas claras, baseadas em boas perguntas, estabelecendo um novo patamar de relação no casal;
– Definir (ou relembrar) qual a missão e os valores dessa família, quais são os papéis que cada pessoa precisa e consegue desempenhar nessa família;
– Falar claramente, com firmeza e sem agressões, o que cada um pensa e sente, tomando decisões em conjunto;
– Refletir mutuamente sobre que tipos de comportamento que não estão funcionando, e definir o que fazer dali em diante (com ações específicas, mensuráveis, possíveis de serem alcançadas, relevantes e delimitadas no tempo), ambos se comprometendo verdadeiramente com a mudança.
Fonte:
“IBGE: Mesmo empregadas, mulheres dedicam 8 horas a mais do que homens nos afazeres da casa”. Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/06/04/ibge-mesmo-empregadas-mulheres-dedicam-8-horas-a-mais-do-que-homens-nos-afazeres-da-casa.ghtml
“Women Spend An Extra 15 Hours On Domestic Labor Compared To Men, Survey Shows”. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/shaheenajanjuhajivrajeurope/2020/05/21/dial-for-working-parents/#5fafd62a7847