Nas gerações passadas, em que as famílias eram numerosas e era comum que os pais morressem cedo, o primogênito tinha o papel instituído de cuidar e servir de exemplo para os demais filhos, com os bônus e ônus que isso acarretava.
E apesar de todas as mudanças na sociedade em geral e na constituição da família em particular, esse modelo do mais velho como autoridade foi sendo mantido, mesmo com a redução do número de filhos e com o aumento da expectativa de vida dos pais.
Hoje em dia isso começa a ser discutido por pesquisadores que estudam o desenvolvimento humano e familiar, e a ideia de que esses estereótipos não cabem mais na atualidade vem ganhando força.
Quem tem irmãos ou tem mais de um filho sabe que inevitavelmente os irmãos influenciam uns aos outros, e que cada um tem seu papel nesse sistema familiar. No entanto, quando esses papéis são imutáveis e aprisionam as pessoas em vez de individualizá-las, podem – e é bom que o sejam – revistos.
Para citar um exemplo de como os papéis familiares historicamente constituídos vêm se modificando, recentemente um estudo conduzido pelas Universidades de Tel-Aviv (Israel), Calgary, Laval e Toronto (Canadá) descobriu que o filho mais novo também influencia o mais velho, ao contrário do que se acreditava até então.
O irmão mais velho em geral tem mais vivência social, mais liberdade dada pelos pais e até um repertório maior em termos de vocabulário, conhecimento na escola e até de “besteiras” (ex.: conhece mais palavrões), e é natural que o caçula veja o irmão maior como ídolo, deseje ser como ele e o imite. O problema é quando essa relação vem de fora, como uma exigência dos adultos cuidadores, na forma de intervenção desnecessária e até prejudicial.
Uma das grandes vantagens de se ter um irmão é a possibilidade de desenvolver desde cedo a habilidade de discutir com iguais, de ter contato com o conflito e de encontrar formas para resolvê-lo. No entanto, quando os pais atuam como árbitros dos filhos, decidindo quem é “grande demais para brigar” ou quem “é imaturo demais para resolver algo por si só”, extinguem essa possibilidade.
Quando se estabelece entre os irmãos que um deles tem papel de autoridade sobre o outro, isso pode trazer diversas consequências, inclusive com repercussões para a vida adulta: amadurecimento precoce do mais velho, com sobrecarga psíquica deste, que se sente impelido a ser mais adulto do que de fato é. Por outro lado, isso despotencializa o caçula, que não se sente capaz de tomar as próprias decisões.
Então, como os pais podem agir para colaborar nessa delicada relação entre irmãos, incentivando a amizade e a cooperação em vez da rivalidade?
Marcia Belmiro orienta que o mais velho não deve ter a responsabilidade de pai ou mãe, seja para dar o exemplo, seja para corrigir algum comportamento errado do caçula.
Quando parte dos filhos a relação de superioridade e inferioridade, de que um irmão deve ser exemplo para o outro, os pais podem ajudá-los valorizando no dia a dia o que cada um tem de especial, sem a necessidade de um ter que se espelhar no outro. Os pais podem ainda substituir falas como ‘você deve cuidar do seu irmão’ por ‘na nossa casa todos cuidam de todos’, estimulando o compromisso em todo o sistema familiar”, analisa Marcia Belmiro.
Fonte:
“O primeiro, o do meio, o mais novo… O que a ordem de nascimento diz sobre cada irmão”. Disponível em: https://revistacrescer.globo.com/Familia/Irmaos/noticia/2018/11/o-primeiro-o-do-meio-o-mais-novo-o-que-ordem-diz-sobre-cada-irmao.html