Não existe relação duradoura que não tenha conflitos – e até confrontos. Dito isso, é normal que casais briguem vez ou outra, por motivos importantes, como a forma de criar os filhos, ou triviais, como a louça suja.
Quando esses casais têm filhos, frequentemente se perguntam se essas discussões podem ter impacto negativo sobre as crianças. A questão, dizem os estudiosos no assunto, não são as discussões em si, mas como elas se dão e com qual frequência.
Gordon Harold, professor de Psicologia da Universidade de Sussex (Reino Unido) e autor do estudo “How Family Relationships Affect Children’s Early Development: Unpacking Nature from Nurture”, analisa que os conflitos interparentais e as violência doméstica estão entre os principais fatores familiares que mais afetam as crianças.
Quando essas brigas são frequentes e/ou intensas, podem causar consequências sérias nos filhos, como depressão, transtornos de conduta, automutilação, uso indevido de substâncias, psicose, fracasso escolar e até suicídio, afirma Harold.
O professor atesta inclusive que esses danos podem acontecer independentemente de serem filhos biológicos ou adotados; de os pais morarem juntos ou separados; e de se tratar de violência física ou psicológica.
“Não se pode afirmar que a totalidade dos filhos de pais que brigam vão sofrer com isso. No comportamento humano não existe uma regra universal, mas é possível dizer que existe uma tendência nesse sentido”, analisa Marcia Belmiro.
O divórcio, ao contrário do que se imagina, não parece causar traumas nos filhos. Um estudo da Universidade de Cardiff, no País de Gales, demonstrou, no entanto, que as discussões que ocorrem antes, durante e depois do divórcio causam, sim, danos às crianças.
Marcia explica que os sentimentos mais comuns das crianças que presenciam brigas entre seus pais são de medo, culpa e abandono. O medo pode ser pelo fato de o pequeno não saber se o pai pode machucar a mãe ou se ele próprio pode ser ferido. O filho pode até acreditar que fez algo de errado – daí a culpa.
O sentimento de abandono costuma aparecer em casos mais graves, quando a criança se sente emocionalmente negligenciada, ou mesmo esquecida em suas necessidades físicas, como de higiene e alimentação.
Nessas três situações as reações infantis podem ser de revolta, com birras e gritos, ou de abatimento (quando a criança se torna quieta, com semblante fechado). São comuns também afastamento social e baixa performance escolar.
“Uma briga de casal não necessariamente tem gritos, ofensas ou ameaças. Ignorar a presença do cônjuge ou não levar em conta suas necessidades também são atitudes violentas, e as crianças facilmente percebem o clima de hostilidade entre seus pais. Por outro lado, os pais ensinam muito aos filhos quando conseguem resolver seus desentendimentos de forma respeitosa e honesta, por meio do diálogo, servindo de modelo de relacionamento saudável para os pequenos”, analisa Marcia Belmiro.
Fonte:
“How Family Relationships Affect Children’s Early Development: Unpacking Nature from Nurture”. Disponível em: http://www.childreninwales.org.uk/wp-content/uploads/2017/08/Gordon-Harold.pdf