Há crianças que parecem ter uma predisposição à autoexigência além do que é saudável. Desde cedo demonstram ter expectativas irreais e tanto medo de falhar em seus objetivos que muitas vezes isso as impede até de se aventurar em novos desafios.
Na escola, por exemplo, as crianças perfeccionistas costumam ser ótimas alunas, obtêm boas notas, mas nem conseguem celebrar suas conquistas, já que seu foco constantemente está no que não foram capazes de obter.
Essas crianças se impõem metas irreais e, quando falham (ou não alcançam a perfeição esperada), sentem isso como uma grande e irreversível derrota. A ansiedade pelo resultado (e, consequentemente, pelo reconhecimento externo) causa frustração, gerando um ciclo vicioso de preocupação, medo e decepção contínuos.
O que diz a ciência
Uma pesquisa feita na Universidade de Poitiers, na França, com alunos do 6º ano, demonstrou que as crianças podem ter um desempenho melhor na escola e se sentir mais confiantes sobre si mesmas se forem informadas pelos adultos de que o fracasso é uma parte normal do aprendizado – ou seja, a valorização do esforço acima das características intrínsecas, como inteligência ou beleza.
No estudo, os estudantes que receberam orientações sobre o erro ser uma parte da trajetória para chegar ao acerto tiveram melhores resultados – tanto nas atividades mais fáceis quanto nas mais difíceis. A partir desse experimento, podemos perceber que a maneira com que o adulto lida com o erro e com o acerto vai influenciar na visão da criança sobre o assunto.
A importância do exemplo
A autocobrança muito elevada geralmente está relacionada a uma necessidade grande de aprovação e validação externas – principalmente dos pais.
Os pais, com as melhores intenções, muitas vezes elogiam o sucesso do filho, não o esforço para obtê-lo. Assim, pode se instalar na criança uma crença de ter nascido naturalmente inteligente, corajosa, habilidosa. Mas paralelamente a isso surge também um medo: “E se minha mãe descobrir que eu só sou bom em vôlei, mas sou péssimo em futebol?” Assim, a criança cresce dentro de sua faixa de conforto, sem nunca arriscar algo novo.
Há ainda os pais que não têm esse tipo de comportamento com os filhos, mas cobram demais de si mesmos (precisam ser os melhores no trabalho, cozinhar com perfeição e até terem resultados brilhantes em seus hobbies). A criança percebe esse padrão familiar e naturalmente o espelha para si.
Como ajudar na prática
Para auxiliar a criança, os pais podem ter conversas claras com o filho sobre o assunto. Nessas conversas, pai e mãe ajudam o pequeno a ver-se no comparativo consigo mesmo. Para isso, não é preciso recorrer a elogios vazios de sentido (tipo: “você é lindo”, “como você é esperto”), mas trazer fatos reais, lembrando de desafios que a criança já ultrapassou por meio de esforço e comprometimento.
É importante também falar que ninguém consegue se destacar em tudo, mas apesar disso é possível, sim, sentir prazer em muitas coisas (ex.: você não precisa ser cantor profissional para gostar de cantar em casa, entre amigos, no karaokê).
“É fundamental que a criança saiba que, independentemente do resultado que obtiver em qualquer coisa que deseje fazer, sempre vai contar com o amor dos pais – o que é bem diferente de valorizar a mediocridade ou a falta de esforço. Essa é uma conversa necessária e contínua, até a criança se sentir mais pronta para ousar”, analisa Marcia Belmiro.